A carta de hoje fede - e muito
Carta #106
Segunda-feira, 23 de junho de 2025, 08:24. Chove lá fora; acordei às 6:00 com o meu gato de 19 anos convulsionando - lá foi eu levá-lo ao veterinário. Tudo deu certo e aqui estou - ele, ainda internado (para tomar um soro, vitaminas etc.).
Era um dia de sol, quando você fazia a necropsia daquele bovino (ou qualquer espécie animal).
Ao abrir a cavidade abdominal, encontrou muita fibrina espalhada na superfície de todos os órgãos, que estavam com várias áreas vermelhas.
Na verdade, você encontrou mesmo uma massaroca: malemá era possível identificar o que era intestino e o que era fígado.
Estava claro que peritonite foi a causa da morte daquele animal. Então, você se faz outra pergunta:
Quem foi que causou a peritonite?
Em uma carta anterior, falei sobre o que levaria à peritonite em animais domésticos (em um vídeo também, clique aqui para assisti-lo). Listá-las-ei aqui:
Ruptura de intestino, estômago e abomaso
Ruptura de bexiga
Bactérias que causam polisserosite em suínos
Peritonite infecciosa felina
Ruptura de útero
COMO DESCOBRIR A CAUSA DA PERITONITE?
De forma geral, todas elas levarão ao extravasamento de fibrina que, com o tempo, causará aderência dos órgãos, aumentando a dificuldade na identificação do problema.
Já adianto: quando a ruptura de um órgão (principalmente gastrointestinal) for culpada, nem sempre será fácil (ou até possível) identificá-la.
Por isso, o primeiro passo de toda necropsia com peritonite é examinar todos os órgãos abdominais detalhadamente.
Você precisará remover e analisar todos (sugiro fazer com um órgão de cada vez) procurando por hemorragia e coágulos (para excluir ou confirmar rupturas).
Em gatos, a principal causa será peritonite infecciosa felina - não se preocupe tanto com rupturas (haverá vários nódulos, que são piogranulomas, na superfície dos órgãos). Basta coletar todos os órgãos em formol para exame histopatológico.
Em suínos, além das bactérias, úlceras gástricas são importantes: verifique se existem úlceras profundas ou a ruptura do órgão, antes de excluí-la dos diferenciais.
Em ruminantes, rupturas gástricas (equinos também!) e de bexiga são as vencedoras.
E QUANDO O NEGÓCIO ESTÁ TÃO FEIO, QUE NEM CONSEGUIMOS SEPARAR OS ÓRGÃOS?
Geralmente, isso acontece em bovinos e equinos. Darei algumas dicas importantes, a fim de diferenciar qual órgão pode ter rompido:
Abriu a cavidade, viu fibrina e há muito líquido extravasando? Cheire-o (SIM, CHEIRE-O) - será urina e ela estará avermelhada. Corra para olhar a bexiga, uretra, ureteres e rim. Urolitíase começa como a favorita para este caso.
Abriu a cavidade, viu fibrina e muito conteúdo escuro, fétido ou restos de alimento? Prepare-se: o dia será longo. Examine todo o intestino (não se esqueça do reto), rúmen, retículo, omaso e abomaso OU estômago, se for um cavalo.
Necropsias com ruptura de órgãos gastrointestinais costumam feder descomunalmente. É uma mistura de comida podre com bafo de gato (ou cachorro) velho e cheiro do espirro que você dá de manhã, antes de escovar os dentes (EXPERIMENTE ESPIRRAR E REPARAR, ANTES DE ME JULGAR). Apenas podre.

Essas são as minhas percepções após alguns anos fazendo necropsia de peritonite. É assim que eu conduzo o meu exame, quando vejo essa lesão.
Acredite: você não vai querer tropeçar e cair sobre a carcaça de um animal que morreu por ruptura de órgão gastrointestinal (eu não caí, só tropecei e me apoiei na carcaça com força suficiente para o conteúdo extravasado chegar à minha boca, que estava aberta, prestes a proferir palavras impróprias para menores de 18 anos).
Espero que eu tenha clareado suas ideias por aí.
Te vejo na próxima carta,